Cuidados Paliativos

Quando ainda há tanto a fazer…

Os Cuidados Paliativos ainda se encontram, no dia de hoje, envoltos na falsa premissa que são direcionados apenas a pessoas com cancro, com idade avançada e/ou que se encontram a morrer.

No entanto, e de acordo com a Organização Mundial de Saúde, os cuidados paliativos são cuidados que visam melhorar a qualidade de vida de doentes que vivenciam um processo de doença capaz de lhes ameaçar a vida. É neste contexto, através da prevenção e alívio do sofrimento, pela compreensão e identificação precoce, avaliação e controlo da dor e outros problemas físicos, psicológicos, sociais e espirituais que os cuidados paliativos minimizam o impacto da doença na sua dinâmica familiar.

O aumento da esperança média de vida, associada a melhores cuidados de saúde, maior prevenção e conhecimento das doenças e ao acesso mais facilitado de todos os cidadãos a esses mesmos cuidados tem, no reverso da medalha, o aumento de comorbilidades e doenças crónicas que levam cada vez mais pessoas a necessitar de cuidados paliativos.

Assim, pretende-se que os cuidados paliativos incluam os doentes que sofrem de doenças crónicas e incuráveis que contribuem para o aparecimento de sofrimento e diminuição da qualidade de vida, como é o caso de patologias como a insuficiência cardíaca, acidente vascular cerebral e demência avançada.

É importante começar a dissociar o pensamento de que só beneficia de cuidados paliativos quem está a morrer, residindo aqui o maior desafio que encontramos nesta área: a identificação precoce e a referenciação tardia.

Quando pensamos numa morte digna, falamos num processo sereno, sem dor e/ou sofrimento e com o envolvimento do doente e seus cuidadores no plano de cuidados. Vivemos numa sociedade tecnológica, com muitos avanços científicos e, enquanto profissionais de saúde, somos formatados para tratar e curar a doença mantendo-se a ideia de que “quando já não é possível curar a doença não há mais nada a fazer”. Esta linha de pensamento está errada e, na maioria das vezes, serve apenas para prolongar o sofrimento e atrasar a instituição de medidas de conforto que promovem a qualidade de vida do doente e sua família.

Cuidar de alguém que se encontra em fase terminal é um processo complexo que gera muitas vezes nos profissionais de saúde, nomeadamente nos enfermeiros, uma diversidade de sentimentos e emoções, que requer competências não só técnicas e científicas, mas também e acima de tudo humanas.

O Enfermeiro, enquanto membro da equipa multidisciplinar dos cuidados paliativos, assume um papel fundamental no cuidar de forma a dar resposta às necessidades do utente/família/cuidador mantendo as suas práticas baseadas nos conhecimentos técnico-científicos. Somos provavelmente dos profissionais de saúde que mais tempo e disponibilidade pessoal dedicam aos seus doentes procurando o bem-estar, alívio de sofrimento, estabelecimento de uma comunicação terapêutica e eficaz e promoção da qualidade de vida. Devido a esta proximidade, são os enfermeiros que estão em melhores condições para acompanhar o doente em situação de vulnerabilidade juntamente com as famílias, fazendo com que estas participem de forma ativa nos cuidados.

É urgente mudar mentalidades e investir nos profissionais de saúde e em formação pré e pós-graduada nesta área para que estes se sintam capacitados para tratar os seus doentes e respetivos conviventes significativos. Sabendo que existem equipas especializadas na retaguarda para apoiar situações mais complexas, reconhecendo os cuidados paliativos como um elo essencial na cadeia do cuidar e considerando-os um complemento obrigatório no sistema de saúde.

Por último, não esqueçamos que os cuidados paliativos não terminam com a morte, é necessário cuidar de quem cá fica e ajudar no processo de luto. A família insere-se num contexto de fragilidade acrescida por toda a carga emocional a que é submetida, não só por ser fonte de apoio para a pessoa doente, mas também porque vai, eventualmente, acabar por “perder” o seu familiar. É importante aceitar a morte como um processo natural e falar abertamente sobre o processo de morrer de forma a melhorar a atitude em se lidar com a morte.

Assim, os cuidados paliativos constituem um problema de saúde pública e são um direito humano devendo por isso, ser de acesso universal. O objetivo dos cuidados paliativos não é “acelerar a morte” nem a atrasar, mas sim perceber e responder às necessidades (físicas, espirituais, psicológicas e sociais) do doente e famílias de forma a minimizar o sofrimento.

É através da mudança de paradigma que os cuidados paliativos podem ser um fator diferenciador naquele que é um direito fundamental, o acesso à vida.

Andreia Moura – Enfermeira CSSMH

Sofia Laginhas – Enfermeira CSSMH

Bárbara Correia – Enfermeira CSSMH